sexta-feira, 28 de maio de 2010

Saudades V- Uma mera questão de tempo.

Quatro e meia da tarde. Interurbano.
-Amor, quer saber como foi minha entrevista?
-Sim. Pode dizer.
-Pode arrumar as malas.
-O quê?
-Pode arrumar as malas. Estou empregado.
Fecho os olhos, as lembranças vem com as lágrimas.Uma pequena película mental. Minha convicta solteirisse, a conquista, o medo, as fugas, a negação do inevitável. A paixão na mente e no corpo , a cama com cheiro de outra, as brigas, o ciúme, as diferenças, a falta de dinheiro, um começo difícil. A paixão transmutando em amor, a vida melhorando, os passeios, nosso reveillon juntos, nossa rotina maravilhosa, os mimos mútuos, a cumplicidade, o apoio, os sorrisos, o amor bem feito em nossa cama. A mudança, a viagem, o desespero, as rezas, as promessas, os amargurantes e diários choros, a solidão, a espera. A saudade e a saudade e a saudade.
Agora será tudo uma questão de tempo. Como sempre o foi.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Sempre fale de amor com uma anciã.

Como eu sempre digo: um dia não é de todo perdido. Entra-me no escritório um senhor e uma senhora, ambos com mais de sessenta anos. A cruz no pescoço, as vestes brancas e a exclamação ao ver o quadro de Nossa Senhora, cativaram-me logo. Eles eram o meu número.
Explico pormenores do contrato, nos despedimos com solenes apertos de mão.
A senhora fala ao marido-"Vamos logo amor, já está quase na hora de expôr o Santíssimo".
Olho o relógio quase quinze horas. Corro, a encontro no corredor.
-A Senhora me faria um favor?
-Se eu puder...
-A senhora colocaria uma intenção para mim?
-Qual o nome da pessoa ou o pedido?
Digo o nome de meu namorado. Ela compreende, me olha com aqueles olhos de quem sabe muito sobre a vida, a fé, o amor e seus meandros. Aperta minhas mãos entre as dela e diz:
-Coloco sim minha filha. Tudo vai dar certo, viu?
E sorri um sorriso de anjo.

Nota da escritora do blog: Expôr a Santíssimo é um ato litúrgico da Igreja Católica em que um ostensório é posto em lugar alto, as vistas de todos, para a adoração dos fiéis ,que em muda comtemplação fazem pedidos, meditam sobre o sofrimento do Cristo, etc... Abaixo dessa peça as pessoas costumam colocar pedidos , nomes de pessoas, orações. A isso se dá o nome de intenção. Normalmente o horário escolhido é o da hora da morte de Jesus -15:00.

Nunca peça a uma anciã para ela falar mais baixo.

Hoje acordei com a firme determinação de ter um dia maravilhoso. Na loja de conveniência, compro cigarros e uma coca zero dois litros. Brinco com a caixa dizendo-lhe que possuia um bom gosto incrível, ela sorri perguntando o porquê, estávamos com o mesmo anel, risos gerais.
No shopping cumprimento a todos com meu melhor sorriso. O dia parece auspicioso.
Mal me acomodo na poltrona, entra uma senhora com seus sessenta invernos, cabelos desgrenhados, olhos acinzentados e enlouquecidos.
O assunto não era comigo. Viro-me para o computador prestes a ouvir "Born to be wild", feliz da vida com a possibilidade de um dia vir a sentir aquele vento nos cabelos novamente encimada numa moto.
A senhora vocifera impropérios contra meu colega de trabalho e minha mãe. Levanto-me e fecho a porta que ficara meio aberta à sua entrada. Encosto minha mão no ombro da indignada "soprano" e digo gentilmente:
-Senhora por favor, abaixe o tom de voz.
A idosa me olha com olhos raivosos e o assunto também passa a ser comigo. Pronto, por um "dá cá aquela palha" lá se ia a paz desse maravilhoso dia.

terça-feira, 25 de maio de 2010

Uma tragédia evitada pela força do amor e do sangue.

Resolvi ceder os remédios que aquele médico receitou para mim para minha tia. A depressão dela é severa e não tem plano de saúde.
Após colocar os remédios na caixa de correio, ligo para avisá-la.
Ouço no outro lado da linha uma voz gritando e dizendo.
-Não venha para cá!
Minha mãe ao volante, digo - Faz a volta vamos no escritório da tua irmã, estou ouvindo pelo celular que uma tragédia vai acontecer.
Ao celular, gritos de homem e mulher em mútuas ameaças. Chegamos, nem esperei minha mãe descer do carro. Aperto a campainha, um estabanado e aterrorizado rapaz corre atrás de mim perguntando- "A senhora quer falar com quem? Anuncio a senhora?"
As escadas, os urros aumentavam, meus nervos no lugar, a porta.
O escritório destruído, um cenário alarmante, os dois "birots" um de frente ao outro, palavras com ameaças de morte, objetos sendo atirados. A densa e ,tão já minha conhecida, presença do desespero e suas tramas.
Dentro da gaveta do "birot" a arma que eu sabia contida ali.
Olho para aquele homenzarrão, com quarenta anos a mais que eu, poderoso, maçon, dono de terras, comércios e prestígio. Não sei de onde, nem como, nem de onde veio a força e a firmeza na voz, com um gesto de mão digo:
-Senta e se cala.
Minha mãe leva minha tia para fora, pego a pasta dela e saímos.
Olho de esguelha, meu tio continuava sentado e silente.

sábado, 22 de maio de 2010

Cacete de agulha

Quinta passada fui tomar a vacina anti-tetânica e contra o H1N1. Na fila vendo aqueles olhos apreensivos, principalmente dos marmanjos presentes, lembrei desse vídeo antigo que toda vez que vejo rolo de rir.

quinta-feira, 20 de maio de 2010

Pílulas para a infidelidade masculina?

Ontem fui ao médico, minhas dores no corpo voltaram. A bendita Fibromialgia.
-Olá, como está passando?
-Doutor, minhas dores no corpo voltaram.
-Alguma causa de estresse recente?
-Acho que sim. Meu namorado foi morar em outro Estado, sinto muita saudade.
-Sei. Um vazio, uma angústia, não é?
-Sim.
-Choros constantes e sentimento de perda, não é?
-Sim. Ainda mais porque com a distância a insegurança, o vazio e a angústia aumentam, sabe?
-Certo. Deixe eu explicar-lhe algo, isso é o que chamamos de "luto emocional". Muito comum nesses casos. O medo da perda dá-se ao fato que você deva estar insegura longe dele. Medo também que ele arrume outra pessoa talvez e esqueça você. Mas olhe vou te dizer se qualquer mulher tem um parceiro que seja absolutamente fiel, ela tem 90% de chances de estar se relacionando com um homossexual.
Faço cara de espanto, as lágrimas vem aos olhos. O infeliz faz aquela cara de "coitada-ela-não-sabia" e ainda completa:
-Não fique chateada. É que as mulheres não entendem isso. É instintivo e próprio do sexo masculino.
Desabei num choro convulsivo. Ato contínuo ele saca o talonário de receitas e me prescreve anti-depressivos e calmantes.

segunda-feira, 17 de maio de 2010

Saudades IV- O "cercadinho" e o FedEx.


Quinze dias distante e primeiro fim de semana sozinha. Equipei-me toda, três filmes para assistir: "A Paixão de Cristo", "A casa do lago", "U2-vertigotour live in São Paulo. Três livros: Agatha Christie- "Morte na Praia", Lima Barreto- "Contos" e "A vida de Siddartha Gautama-O Budha".
Mas o que me salvou mesmo foi o netbook que ele me deu antes de ir embora. Passamos o dia conversando pela web cam. Na hora de dormir ele pediu para eu ligar o TeamViewer, virar a câmera para a nossa cama (a mesma que dormíamos em seu antigo apartamento e ficou comigo), queria me colocar para dormir, me vendo e depois desligar o computador.
Quando estávamos juntos nunca dormíamos na mesma hora então ele me colocava para dormir, um travesseiro na cabeça um atrás de mim, um entre as pernas, um lençol na cabeça e um no corpo, era um ritual que denominamos de fazer o "cercadinho". Dizia sempre- "Boa noite meu amor, durma com os anjos, pegarei as estrelinhas. Nossa Senhora te proteja" , me beijava e dizia "eu te amo".
Dormi sábado e domingo ouvindo as mesmas palavras vindas da fria máquina, mas sua presença era tão pungente que podia sentir até o cheiro dele, o molhado do beijo, suas mãos ajeitando meu cabelo esparramado na cama. Mas nada, nada disso, sublima o calor do corpo dele, seus olhos amarelos, sua ternura, seus cuidados, a presença física.
Estou pensando seriamente em me despachar no próximo FedEx.

domingo, 16 de maio de 2010

Egoísmo mata? Morri.

Meu irmão bateu o carro essa semana, tá doidinho. Que sentimento de culpa eu estou, o coitado está lá, nervoso, tendo que resolver tudo sozinho e eu aqui só pensando no meu nariz. Sei como é fazer mudança, troquei de lar umas dez vezes na vida. Meu primo é que brinca comigo que aquela música do Legião é minha cara -"já morei em tanta casa que nem me lembro mais."
É um tal de encerrar contas, mudar o endereço para correspondência , vender coisas, empacotar umas, jogar fora outras, vender apartamento, frete, condomínio, luz, internet...
A imagem que me vem agora dele é daquele menininho loiro que no meio da madrugada, com medo, com seu ursinho marrom nos braços e nossa cadela atrás dele, batia a porta do meu quarto, procurando proteção, ajuda e apoio.
Vem meu irmão, eu durmo na sala mesmo caramba, será muito bem-vindo.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Saudades III- Uma semana.

QUI NEM JILÓ

Composição: (Luiz Gonzaga / Humberto Teixeira)

Se a gente lembra só por lembrar
Do amor que a gente um dia perdeu
Saudade inté que assim é bom
Pro cabra se convencer
Que é feliz sem saber
Pois não sofreu

Porém, se a gente vive a sonhar
Com alguém que se deseja rever
Saudade intonce aí é ruim
Eu tiro isso por mim
Que vivo doido a sofrer

Ai, quem me dera voltar
Pros braços do meu xodó
Saudade assim faz doer
Amarga que nem jiló

Mas ninguém pode dizer
Que vivo triste a chorar

Saudade, meu remédio é cantar
Saudade, meu remédio é cantar

Do Dia das Mães e da sensação de fracasso.

Dia das mães passamos em uma cidade serrana aqui de meu Estado. Éramos meu pai, irmão, mãe, tia e primo.
Sorri, brinquei, dormi bem, comi melhor ainda. Conversei com antigos e novos conhecidos, passeei pela cidade, bati fotos, tomei minha cervejinha na pracinha no fim da tarde, vendo a revoada de pássaros canoros, curtindo um friozinho e falando com meu amor ao telefone.
Fui à missa, comunguei e assisti a quatro casamentos.
Na última noite subimos a um restaurante na parte mais alta da cidade. Na mesa muita comida, bebida, troca de presentes, fotos, vídeos. Estávamos saciados, bêbados e felizes. Meu irmão oferece mais uma rodada de bebida para todos. Negamos enfim já estávamos mais que ébrios. Ele fala lacônico- Bebam, vocês vão precisar depois da minha notícia!
Ele faz aquele suspense, saca um papel do bolso, pede a meu primo que o leia. A remoção dele com outro servidor foi deferida. Ele volta ao Estado no prazo de dez dias depois de quatro anos longe. Todos chorando de felicidade, aquela festa!
Eu desabei mas não dei bandeira. Fico feliz por minha mãe , ela sofria muito a ausência dele e eu também.
A causa da minha tristeza é que minha vida não ficará nem um pouquinho melhor com os quatro morando juntos novamente. O apartamento agora é muito pequeno, mal nos cabe. Mamãe faz questão que ele fique com o quarto onde está o closet com minhas roupas e o banheiro que uso.
Resultado, dormirei no menor quarto, com a menor televisão (sou míope de Jó) e sem antena. Um quartinho atulhado, sem ar condicionado e quente. Tomarei banho no minúsculo banheiro social. Não terei acesso a minhas roupas, nem ao banheiro. A internet está na sala e nesse quarto. Ele usará por um tempo a minha mesmo.
Assim, com um simples pedaço de papel, meu irmão conseguiu levar embora o restinho de privacidade e conforto que eu tinha na casa de meus pais e ainda minha paz de espírito. Egoísmo? Pode ser...mas pela mente passou um balanço da minha vida.
Mulher feita e envelhecendo, ganhando pouco, gastando muito, sem dinheiro para morar só, sem companheiro, sem marido, sem filhos, namorado longe, sem amigos, quase sem família, sem carro, sem privacidade ou liberdade. Nessa hora me dá uma vontade de ter, ou ter deixado de fazer muitas coisas de maneira diferente. E pensar que já possui tudo isso que elenquei e não foi a muito tempo. Ontem nem consegui vir trabalhar...que sensação ruim, Meu Deus. Mas vamos em frente, pois como disse Chico Xavier com sapiência: "Ninguém pode voltar e criar um novo início, mas todo mundo pode começar hoje e criar um novo final"

quinta-feira, 6 de maio de 2010

Nunca é tarde para ser rebelde.


Falar em meu pai, a novela Gabriela, foi televisionada novamente na TV em junho de1982, às 22h15, compactada em 12 capítulos.
Eu, a época com 7 anos de idade fui proibida de assisti-la. Aliás, não pude assistir muitos programas na televisão censurados por meu pai. Ele dizia que certos programas eram "imorais" ou "violentos" para uma criança, além de passarem muito tarde da noite.
Lembro também do "Mão Branca" , um programa policial ao qual também não podia assistir. Mas ficava acordada de madrugada olhando pelo buraco da fechadura do quarto deles.
Agora com 34 aninhos achei esse exemplar do Jorge Amado, estou lendo. Bem, realmente não seria uma literatura para crianças, televisionado então nem se fala...
Agradeço a meu pai por ter estendido por mais alguns anos minha inocência pueril.

Xixi fora do vaso.

Hoje pela manhã, mamãe reclamou à empregada que o banheiro de meu pai estava sempre com cheiro ruim.
-Olhe dona, eu limpo que só esse banheiro, coloco água sanitária e tudo. Mas todo dia o vaso fica sujo e salpicado de urina, até no chão e na tampa. Olhe, leve a mal não mas peça para ele "segurar" quando for urinar.
Eu e minha mãe estamos rindo até agora do "pinto torto" do meu pai.